segunda-feira, 6 de agosto de 2012

Impressões sobre Batman,o cavaleiro das trevas ressurge

Impressões sobre Batman-1 1)Marion Cotillard não colou como vilã.Ela é linda,excelente atriz, mas não me convenceu como fundamentalista..
2)O que é o Alfred?De todos os filmes,foi o que ,na minha humilde opinião,teve mais carga dramática,talvez por conta do roteiro.Linda a cena em que ele se despede de Bruce Wayne...
3)Lendo um texto sobre a construção do roteiro,aprendi sobre uma técnica,que consiste em dar uma certa ênfase a um objeto que será crucial no clímax da trama.É engraçado como ,na hora em que o Gary Oldman pôe o discurso no bolso,pensei:é isso!!!só achei a seqüência longa demais.Uns 2 segundos a menos ficariam mais leves na narrativa
4)Não me convenci com o vilão.Me parecia muito construído e artificial,em comparação com o saudoso Heath Ledger,que era descontrolado e visceral.Penso que o Tommy Lee Jones como two-faces e o Jack Nicholson como Coringa tinham essa pegada,mas Ledger extrapolou o espaço do vilão para se tornar a alma do filme.Minha seqüência preferida é quando ele e Batman estão sozinhos numa sala:
Adoro as falas:
" a moral deles é uma piada ruim.."
"as pessoas são tão boas quanto o mundo permite.."
"eu não sou um monstro,eu só estou na vanguarda...
"matar é fazer uma escolha."
É incrível como o Batman se torna um personagem menor,apenas fornecendo a deixa para que o Coringa brilhe e ele brilha,tresloucadamente,de forma incontrolável..Fico pensando como deve ter sido difícil dirigir Ledger,ou talvez sua preparação tenha sido absurdamente profunda,mas o Coringa que ele constroi tem uma força que transcende o filme.Senti muita falta desse descontrole na última parte da série. 5)As seqüências de ação são sempre muito boas,afinal Hollywood é onde a indústria cultural encontra sua força maior,mas de fato é impossível,em um ambiente feito para desconectar o público do cotidiano e amarrá-lo a uma outra realidade,não pensar no episódio do cinema no Colorado.Ai de quem entrasse com uma mochila no Cinemark.
6)Penso que o uso de primeiro plano nas seqüências entre o Alfred e Bruce foi uma escolha acertada do diretor..A escolha dos tons azulados dentro da Mansão Wayne também foi boa,na modesta opinião desta blogueira
7)Não pude deixar de fazer uma conexão entre a fuga da prisão e o mito da caverna..Mas é claro que até o tapete do Cinemark sabia que Bruce iria conseguir escapar..E os ortopedistas que por eventualidade assistiam o filme devem ter saído da sala,revoltados,quando Bruce simplesmente levantou e andou,apos uma lesão que pretendia ser permanente..coisas do cinema.
8)Gostei da forma como o roteirista(ou o diretor)terminou o filme,pela simples sugestão de uma continuidade na historia.é claro que irei assistir os próximos Batman que vierem,mas reforço minha opinião:sem Ledger,será apenas mais uma boa diversão

sexta-feira, 3 de agosto de 2012

Cinema, pizza e pilantragem

Após 2 merecidos meses de férias, retorno do tempo em que fiquei offline, tendo assistido pouquíssimos filmes devido a estudos paralelos. A vontade era de assistir uns 10 em cartaz, mas infelizmente não deu. Bom, finalmente de volta ao mundo real, ou o que o valha, começo as aulas de roteiro e documentário pela exibição do filme Wilson Simonal “Ninguém sabe o duro que dei”, dirigido por Micael Langer, Calvito Leral e Cláudio Manoel (2009).
É incrível como o início de um filme, seja lá qual for, sempre me causa o mesmo frio na barriga, ante a experiência em perspectiva. O que será que vai acontecer comigo, quais caminhos vou percorrer, quantas estradas vão se abrir na exibição de imagens ali na minha frente?Mesmo já tendo assistido o filme no Festival do Rio, um filme é uma experiência do tempo, sempre outro a cada exibição, porque somos sempre diferentes. E assim foi Simonal para mim naquele momento. Na posição confortável de quem já sabia o que ia se passar, eu pude voltar minha percepção à reação da plateia com a história que efetivamente não conheciam. Das conversas abafadas num ambiente mais informal que no cinema padrão, a epopeia do artista foi tomando conta dos espaços, forçando os silêncios, não é todo dia que se vê um cantor comandar com maestria 30 mil pessoas, num coral tão impossível quanto real.
E assim, sua trajetória sobrepõe-se ao riso, ganha importância, impõe sua presença na história do cara pobre que ganhou o mundo em músicas suingadas e simples, sem falsas ilusões ou promessas. Simonal é o que é, canta porque é seu modo de comunicação fundamental e ele o faz com absurda competência, como se transformado em um potente veículo de comunicação de massa pela grandeza de seus acordes e pela simpatia de seus gestos.
Além disso, a estrutura do documentário foi construída com base em Motion Graphics, a genial tecnologia de mover, manipular e recortar imagens,tornando-as animadas e formando novas composições estéticas,para além da mera exibição de fotos.Os depoimentos coroam o conjunto. São emocionados, viscerais, dolorosos. Quase que como se todos vissem o personagem principal de novo materializado e tentassem reter sua presença, como se sentissem responsáveis por sua morte. No fundo do auditório, aqui na plateia, já se ouve fungar de narizes em alguns cantos. É a história que bate em nossos rostos com o tema de uma grande injustiça. Onde estava a história desse cantor tão grande em sua trajetória, que foi extraída da grande mídia?Que condenação pode ser maior a um artista do que o ostracismo?
O filme não busca condenação para o episódio em que Simonal, por diferenças com seu contador, supostamente mandou dois homens (que seriam do exército) darem uma surra nele. O roteiro inclui inclusive o depoimento do próprio contador, registrando a ocorrência do que foi um caso de tortura, uma vez que ele foi levado aos porões do DOPS e supliciado pela máquina repressora do Estado.
Não é papel da narrativa inocentar Simonal. O principal réu é a mídia, questionada da falta de apuração sobre a suspeita de Simonal ser informante do Dops e o silêncio retumbante que se fez, principalmente entre a classe artística, uma vez que o cantor fora despojado de sua fama e carreira. A mídia enterrou o cadáver, mas o homem ainda estava vivo.
É disso que fala o documentário. Que poder é esse que impede alguém de continuar vivo, sejam quais forem as acusações contra ele?No final, a dor maior é pensar que o conhecimento tardio de sua obra não apaga a lacuna de 20 anos esquecimento, nem cura a mágoa dos amigos e familiares.
O papel do cinema então é o do mensageiro, que vem à luz trazer a notícia de que houve um dia um homem morto em vida pelos caprichos da mídia. É a contra-mediação, a mediação do cinema questionando a midiatização corporativa dos veículos de imprensa dos anos 60 a 90, que calaram por sobre uma injustiça que deviam, por princípio, combater. Culpado,ou inocente, Simonal era um artista e dois grandes.Sua ausência no cenário cultural é um absurdo que a produção do filme e os familiares do cantor tentaram combater.A julgar pela pequena plateia de olhos vermelhos no final da exibição, conseguiram seu intento.Para coroar a noite,fizemos uma rodada de pizzas no pátio da faculdade, afinal não só de ideias vive o homem.Não podia haver modo melhor de recomeçar o semestre.

domingo, 27 de maio de 2012

"- Gravando!"

A luz que não dá, o roteiro que não está pronto, os objetos de cena que não arranjamos e o elenco que não está escolhido. Assim foi o primeiro curta metragem da minha vida.Até o momento em que se diz "gravando” a primeira vez, tudo parece um grande trabalho escolar, com o diferencial que existem muito mais pessoas envolvidas e muito mais elementos que podem dar errado ou simplesmente não funcionar.Fazer um filme é contar uma história que provavelmente não será original com elementos visuais que a façam única para aqueles que vão assistí-la,o público em questão.Para quem entra num cinema ou escolhe um DVD provavelmente a ideia de fazer um filme fica no patamar das mágicas que assistimos vez por outra, onde alguém por trás dos bastidores vai realizar algo incrível em que com certeza iremos acreditar, ou não, mas de qualquer formar nos convidará a viajar com ele. Do lado de cá da câmera o buraco é mais embaixo: o mágico é você.Pelas suas mãos ou olhar,passará cada detalhe escondido nas linhas de um roteiro e é preciso ser fiel ao máximo à narrativa que se escolheu.Se, de início, o mais difícil era pensar na locação, uma vez lá existem mil fatores a serem observados.Precisamos diminuir a luz para que o ambiente torne-se escuro e assim, melancólico.Precisamos usar lâmpadas na cor certa para dar o tom de tristeza ou emoção que a cena exige. Precisamos registrar a passagem do tempo em cada folha acrescentada à pilha que fica ao lado do personagem-escritor, que trai a mulher e é abandonado por ela.Precisamos ainda encontrar o tom certo para que a história não descambe para um dramalhão ou uma comédia rasgada.Deixemos os risos(sempre nervosos)para as ótimas tiradas do elenco, nos cacos de encenação que renderiam um outro filme, de tão bons.Não estamos no centro da ação, mas a ansiedade é absurda. Quando o elenco vai chegando vemos entrar um a um os personagens da história que queremos contar. São respectivamente a mulher e a amante do escritor e ele próprio, sentados conosco na sala discutindo a melhor forma de trabalhar. Contar uma história no cinema é amarrar juntas as mãos de todos os participantes da equipe.Estamos todos,ao mesmo tempo, filmando, atuando, dirigindo, cuidando da luz e maquiando os atores. E, além disso, todos os detalhes são de responsabilidade de cada um da equipe. Desde o batom vermelho que marca a história toda até a fresta de luz que fica na área do apartamento de um dos membros do grupo, para provável desespero dos pais dela se soubessem a quantidade de gente que se acotovelou por horas em sua casa. Durante o dia todo nos contorcemos e nos esprememos em pequenos espaços para que ela pudesse reinar absoluta: a câmera. É ela que concentra nossos olhares e quando ela é ligada é preciso que interrompamos conversas e até a respiração para que tudo possa sair direito. Respirar também é a tarefa da atriz que faz a esposa traída, para encontrar o tom certo de raiva .Uma preparação de elenco é simulada no corredor e ser mantida presa por alguns minutos é o suficiente para que, de um rosto angelical, saia uma torrente de palavrões ditos na cadência tão certa que chegou a arrepiar. Irrompemos em palmas, entusiasmados.Igualmente perfeita é a entrada da amante, interagindo com o ótimo ator no papel do escritor, fumando um cigarro atrás do outro(o ator não fumava e parecia ter anos de tabagismo nas costas). Ao retirar o sobretudo a atriz surpreende seu companheiro de cena e a nós, agindo com tanta naturalidade que não era preciso dirigi-la.As cenas iam se sucedendo e tudo o que queríamos era que durasse para sempre, mas que acabasse logo.Havia a preocupação do calor e da fumaça e o cansaço do dia inteiro de gravações que podia atrapalhar a ação dos atores, a parte mais sensível do processo, uma vez que contribuem com suas emoções, mergulhando nos personagens quase sem tempo para respirar. No final de tudo, fica um gostinho de quero mais, uma ansiedade quanto ao resultado das imagens e um vinculo enorme com todas aquelas pessoas que passaram o dia entre “corta”, ”gravando” e “valeu”. Valeu mesmo,para todos nós.

quarta-feira, 23 de maio de 2012

Olhares de Walter Salles

Pensar em Walter Salles é pensar na infinita sensibilidade que desconstroi sentidos nas imagens que enquadra em seus filmes.Ontem na aula de teoria da linguagem,assistimos um trecho de Terra Estrangeira,filme do diretor,de 1995,que retrata o exílio em todas as suas definiçoes,enquanto delineia encontros e desencontos numa narrativa densa e coroada por um magistral preto e branco.Na historia,Manuela,a personagem de Laura Cardoso incute no filho o sonho de conhecer sua terra natal em Portugal,com o confisco das poupanças pelo plano Collor,Manuela morre ,o que leva Paco em busca de seu lugar,num exílio permeado de descobertas sobre si mesmo e sobre a realidade que escolheu para viver.Mais do que pensar na história,o depoimento de Walter Salles convida a um mergulho na imagem que deu origem à história,um barco naufragado em plena praia .Todo o universo que se criou a partir de uma pintura visualizada por ele em um singelo passeio às margens do Rio Sena,foram uma sucessao de imagens construidas por sua absurda capacidade de construir sentido e pintar cenários a partir de seu olhar para o mundo.O filme é belíssimo,mas a linguagem de Walter Salles ainda o é mais. Terra Estrangeira-Trecho http://www.terra.com.br/cinema/drama/terraest.htm

terça-feira, 22 de maio de 2012

da magia à razão

Sei la,ando tao apaixonada pelos antigos diretores de cinema como Griffith e Rosselini que acabei me afastando um pouco da tecnologia do blog..kkkkkkkkkkkkk...Muita coisa para falar...tive minha primeira aula prática de câmera e foi maravilhoso...É realmente uma espécie de dança que se executa,na medida em que o câmera vai focalizando seu assunto,com o máximo cuidado em não balançar a câmera.Descobri que existem milhares de tipos de cÂmeras,das mais simples que cabem numa mochila,a acoplada a um carro,como uma visao do transformers..rs...Descobri que,em cada sequencia,uma infinidade de fatores determina a precisao e sensibilidade com que uma historia sera contada.É realmente uma industria poderosa,essa de criar universos com imagens e sei que,ao travar contato com as câmeras,me senti infinitamente em casa...rs..

sábado, 21 de abril de 2012

A primeira vez


Vídeo-Mito da Caverna
A primeira vez a gente nunca esquece..Passei dias de terror com a perspectiva de apresentar meu primeiro trabalho.A ideia era usar pinturas e vídeos para contar uma história.Escolhi o Mito da Caverna para comparar a época medieval e o Renascimento,no que diz respeito à construção do conhecimento.Ignoremos o fato de que a racionalidade levou ao nazismo e blablablá.o fato é que pensar por si,sem a mediação da igreja,foi o ponto de partida para uma série de teorias sobre a sociedade e o homem.Essa história,da humanidade presa em uma caverna,sem ver o mundo e,de repente,um prisioneiro liberto,conhecendo a realidade,sempre me apaixonou..O vídeo ficou simples,mas a sensação de vê-lo sendo exibido numa sala escura é indescritivel,magica,viciante...

sábado, 7 de abril de 2012

Crítica:Heleno em campo


Antes de começar aviso que este não é nem pretende ser um texto sobre futebol. Se fosse, eu estaria enganando a todos aqueles que vierem a ler essas palavras um dia e a mim mesma. Não, esse texto se refere à paixão, combustível essencial do filme Heleno, tema sobre o qual me debruço recém saída da sala de exibição. De fato, antes de assistir sua história eu não tinha a menor ideia de quem havia sido Heleno de Freitas, a não ser as poucas informações que a publicidade do filme divulgara: jogador, boêmio e temperamental eram as características que chegaram até mim e que de fato correspondiam ao personagem principal.
Sim, Heleno fora um instável craque do Botafogo da década de 40, viciado em mulheres e éter, intenso e controverso até o final de sua vida. Mas o filme não somente relata sua história,dramática como devem ser as vidas de todos aqueles que as vivem pelo viés da paixão.Em vez disso delineia os traços de um personagem que penetra por nossas retinas e se cola ao imaginário do público de forma tal que é impossível passar indiferente a ele.Logo na primeira cena,o espectador se depara com um Rodrigo Santoro extremamente envelhecido em um big close(o ator emagreceu 12 quilos para o papel),tão preso ao seu tempo passado como às rodas de sua cadeira,embrulhado em um velho roupão e chinelos com meias,mãos magras e enegrecidas,rasgando seus recortes de jornal.
É um soco no estômago para aqueles(as)que chegaram ao cinema esperando encontrar Rodrigo Santoro em sua mais bela forma física.Ali não há um galã,há um ator em pleno exercício de entrega com seu personagem.Naquele momento Heleno expulsa Rodrigo da cena e toma todos os espaços.O olhar do ex-jogador se perde e o público compreende que a narrativa vai começar,desfiando o rosário de suas desventuras.É preciso ressaltar o acerto na escolha de viver Heleno em preto e branco,trazendo de volta o glamour dos anos dourados.A câmera se move em direção a um campo de futebol,onde o jogador,em meio a uma torrencial chuva,dribla companheiros e adversários na busca de um gol.A fotografia é primorosa e é possível acompanhar cada detalhe da movimentação dos jogadores com impecáveis tomadas.Ao deparar-se com um Heleno jovem,belo e incontrolável é pesaroso voltar ao personagem do presente na narrativa,magro e estático e é um susto constatar que se trata do mesmo ator.
É importante ressaltar que a escolha de realizar grande parte das filmagens em close, sugere a necessidade de mergulhar no universo do jogador, registrar seus sentimentos mais profundos, sofrer como ele e vibrar com seus rompantes, quase como se, com a aproximação da câmera, o diretor sugerisse que nos colocássemos, público, na linha de frente do campo, junto com Heleno. É impossível não tomar partido e identificar-se com o ser humano que berra,sofre,joga,cai e se levanta,delineado pela luz do projetor.
A história avança e o jogador caminha em direção a sua epopeia, encontrando as mulheres de sua vida e as dificuldades dentro do Botafogo, muito em parte causadas por sua indisciplina e irritabilidade. Mas quando Heleno avança,é impossível não se encantar com seus gestos e entender a magia que cerca o personagem,jogando bola na praia de Copacabana .Na trama,o jogador vai fazer par romântico com uma belíssima Aline Morais(Silvia),mas arrebatar muitas outras saias (e inimigos também)ao longo de todo o filme.Entre um encontro e um jogo,o drama do vício em éter e da sífilis perpassam a história, assim como a traição de Silvia e a decadência sucessiva de Heleno, migrando de clube em clube até o completo ostracismo.Em todo o tempo do filme o contraste entre o personagem jovem e o Heleno do fim da vida,confinado a um sanatório para doentes mentais, causa choque,como se a intenção do diretor fosse mesmo conflitar passado e presente,como forma de delinear o caráter breve da vida do jogador.Seus destemperos,sua paixão desmedida pelo Botafogo e seus tropeços constroem um personagem sedutor,mesmo aos não amantes do futebol.
O que se vê na tela não é somente um jogador, magicamente retratado pelas lentes fantásticas de Walter Carvalho, mas um ser humano nitidamente factível de existir,construído com base unicamente na paixão.É impossível também deixar de comparar a história de Heleno com as notícias esportivas dos dias atuais,comparando-o os mega jogadores apoiados somente pelo marketing de seus times .Heleno não faz concessões,não aceita regras,impõe seus gestos e sofre as conseqüências de suas ações.É intenso e desmedido e leva essas características até seus últimos momentos,esquecido na clínica de repouso,sendo cuidado por um enfermeiro (Maurício Tizumba )que muitas vezes rouba a cena,em tiradas hilárias.São dele as horas mais fraternas do personagem, em seus últimos momentos.
Heleno não é, enfim, um filme sobre futebol,o que pode incomodar muitos amantes do Botafogo.É um filme sobre um jogador e seus dramas pessoais,magistralmente retratados pela perfeita fotografia de Walter Carvalho e atuação visceral (e surpreendente) de Rodrigo Santoro.

sexta-feira, 30 de março de 2012

Pausa para uma crônica:A menina que vivia num filme




Era quase tão fácil quanto brincar.. Na vila da minha vó, onde os meus muitos primos costumavam brincar, o chão de pedras virava escorrega, virava foguete, virava esconderijo onde os grupos, divididos em dois, guardavam as bandeirinhas ou corriam para se esconder, numa urgência do pique-pega ou do pique-alto, quem ficasse por último ia invariavelmente para o meio da rua. Eu também me escondia, na pressão infantil que me fazia participar,mas, quando podia, escapulia para escadinha da varanda, onde me sentava, nos meus três ou quatro anos, pra observar a brincadeira alheia. Era ali, no meu silêncio reverente à ação alheia, que residia à melhor parte da minha diversão. Observar os outros brincarem, imaginar falas e fantasiar cenários, era meu brinquedo particular, minha fuga da realidade e a parte mais legal de estar ali. Mais tarde percebi que o costume de me distanciar da ação e passar a observar a cena como se não fizesse parte dela era uma segunda natureza e eu, ao longo da infância, por muitas vezes me surpreendia observando embevecida as conversas entre os adultos da minha família, entre risos e histórias que eu não me cansava de ouvir. Lembro de ouvir tantos "causos" e me sentir tão feliz com a presença de alguns tios meus, que pedia intimamente que o tempo congelasse naquele momento, para eu absorver todo o encantamento que me causavam suas presenças, os risos e as conversas, tanto que era comum ouvir a frase:-"vai brincar menina”e me deixar ficar ali, em estado de vigília, tentando segurar o tempo, como quem interrompe o fluxo das horas só por força da minha própria vontade. Conforme eu ia crescendo, fui percebendo que as vezes durar é a pior coisa que pode acontecer a um momento e que a magia residia tão somente na passagem das horas, que modifica constantemente o cenário, mas guarda na memória o encantamento e por vezes a dor de cada história que vivemos.Hoje, estudante de cinema, entendo que a imagem que eu tentava tão firmemente gravar de meus primos brincando ou das conversas da minha família, eram trechos de histórias que eu queria contar, na narrativa da minha imaginação e tendo meus próprios olhos como ferramentas de apreensão da minha então realidade.Mais do que construir um real, o cinema dialoga com o tempo, tecendo tramas onde sentimento e imagem vão se entrelaçar, guardando em película todas as histórias que puderem ser contadas.Escrever com a luz, como se diz de quem faz cinema, é a tarefa de dar materialidade à memória ,no intervalo entre o sonho e a realidade e ação por vezes involuntária de todo e qualquer ser humano.Somos às vezes confrontados com imagens que irrompem por nosso universo simbólico, provocando indignação, dor ou enlevo, mas nem sempre conseguirmos dar-lhes moldura de concretude,ficando esquecidas em nossa memória até o momento em que decidimos compartilhá-las através da arte.Era assim que eu, já aprendendo a ler,usava palavras que em muitos casos não conhecia o significado, mas que impregnavam minha memória com diversos sentidos possíveis, assim como as imagens que eu tentava avidamente reter em desenhos e pequenos textos, certa de que serviriam para contar a quem quisesse ler, uma parte da minha vida, mas também de uma realidade que só eu conseguira enxergar,como sempre são todas as histórias sempre.Era mágico e eu naquele tempo não poderia adivinhar que vivia num filme, criado dentro de minha cabeça esperando apenas o momento certo de tornar-se eterno.

segunda-feira, 26 de março de 2012

Diário de Bordo - Movimentos de câmera e montagem




Muito tempo sem escrever por aqui,pois as atividades acadêmicas estão se multiplicando e as informações, idem.Ainda falamos do cinema mudo de Edwin Porter e D.W. Griffith e da diferença da narrativa clássica, linear,dos seus filmes, para as vanguardas estéticas do início do século XX.Nesse segundo expoente,o da narrativa não linear,tanto a montagem como a história percorrem caminhos distintos.Não é somente a tarefa de dizer que ocupa um papel de importância,mas como dizer.Se em Griffith, cineasta americano, as histórias tem início, meio e fim, em Robert Wiene ,diretor do expressionismo alemão, a narrativa busca ser onírica, surreal,fantasiosa.Em Porter já se percebia a necessidade de constituir o cinema como linguagem,através dos movimentos da câmera e dos planos seqüenciais.Mas foi Griffith o grande arquiteto da sintaxe fílmica, criando seqüências panorâmicas , uma novidade para a época e diferentes planos num mesmo quadro, ou seja, a ação acontecia em camadas, sendo a principal retratada mais à frente da imagem e tendo ao fundo outro fragmento da ação principal que, ocasionalmente ocuparia a narrativa quando assim fosse necessário.
Exemplo disso é o filme Lírio Partido, de Griffith (1919) Na obra, uma jovem, maltratada pelo pai, se apaixona por um chinês exilado na Amhttp://www.blogger.com/img/blank.giferica. A grande sacada do filme,para alem do advento do flashback na composição da narrativa,é enxugar os excessos da interpretação dos atores,buscando concentrar seus personagens na expressão de seus rostos.É impossível não reconhecer características de Charles Chaplin na personagem da garota pobre,de olhar triste,contemplando o mundo que a oprime.Da fato,descobri recentemente que Griffith e Chaplin trabalharam juntos ,fundando a United Artists.

(cena do filme Lírio Partido,de D. W. Griffith .1919)

Nas aulas estamos ainda nos primórdios do cinema e é maravilhoso pensar que a linha do tempo no cinema se fragmenta em muitas outras,seja no cinema russo de Eisenstein, criador da montagem intelectual,seja no expressionismo alemão que, através de cenários carregados de ambigüidades e jogos de sombras, buscavam retratar a insegurança e as incertezas da sociedade alemã.

(cena do filme Gabinete do Dr.Caligari,de Robert Wiene)

Saindo um pouco da história, fomos (eu fui, ao menos} apresentada à sintaxe cinematográfica e aos movimentos de câmera, como forma de contar uma história. Então entendi que um plano geral é como um prólogo num filme e que a forma de posicionar a câmera de cima para baixo, o famoso plongeè,é um modo de dizer ao público,seja pelo uso já consumado em filmes há anos, que a ação que se busca retratar, guarda uma carga de suspense e crime. é a clássica cena da mesa de pôquer, retratada de cima.


Do mesmo modo, o contra-plongeè, ou seja, a câmera de baixo para cima é um modo de conferir autoridade e mesmo um ar heróico ao personagem. Através dele, vemos bandidos converterem-se em mocinhos e meninos franzinos virarem o homem aranha, no olhar que constrói o herói.


Para alem dos simples movimentos, como o Dolly, que é o deslocamento para frente e para a trás da câmera no eixo e que, associado ao zoom, pode dar a ilusão de um cenário que cresce ou diminui em relação ao personagem, como mágica.

Dolly
Mas, de todos, a mais bela movimentação da câmera reside no plano seqüência, técnica pela qual eu era apaixonada, mas não fazia ideia do conceito, que é filmar toda a ação sem cortes. Assim foi feito em Festim Diabólico,de A.Hihttp://www.blogger.com/img/blank.giftchcok, nessa seqüência:

(Trecho do Filme Festim Diabólico,de Alfred Hitchcock.1948)
Mais do que narrar uma história com diálogos, narra-se com movimentos, planos e montagens, principalmente a montagem. Segundo Stanley Kubrick, esse é o fundamento do filme.Lendo um texto outro dia,de Luis Carlos Merten,descobri que foi através da observação dos ideogramas japoneses que Eisenstein,por exemplo, descobriu o que seria sua forma de organizar a montagem fílmica.Observando que o conceito de lagrima é a junção dos ideogramas olho e água, o cineasta compreendeu que a justa posição de imagens num filme sempre vai originar um terceiro conceito que é a síntese do que se quer comunicar.De fato,o filme não é somente a fragmentação de uma história em planos, mas a construção de diferentes conceitos e ideias pela sucessão de imagens magistralmente justapostas pela direção e equipe de montagem.Para alem de narrar,o cinema propõe caminhos, escolhas, sentidos, na tarefa de escrever entre a luz e a sombra.

terça-feira, 13 de março de 2012

Hugo Cabret: O cinema e o sonho



Devo confessar que costumo desconfiar de filmes muito recomendados. Em geral, me obrigo a assisti-los somente pelo privilégio de discordar. Entretanto, ao ouvir na faculdade algumas pessoas falando que “A invenção de Hugo Cabret” falava sobre a historia do cineasta francês Méliès, fiquei muito curiosa para ver de que forma isso seria abordado numa animação.Pipocas em punho , parti para o cinema, acompanhada de vários amigos.Devo registrar que já havia assistido um vídeo sobre o making of do filme em que eram acentuadas as cenas em que alguns efeitos especais foram realizados,como numa pratica de revelar o truque do mágico,algo que me encantou.A narrativa gira em torno de Hugo,menino de seus oito anos,órfão do pai,talentoso relojoeiro,que morreu e deixou-o aos cuidados de um tio beberrão, funcionário da companhia ferroviária,que também desaparecera,levando Hugo a permanecer escondido na estação de trem,dando corda aos relógios da estação sem que se soubesse que era um menino que realizava o trabalho.A motivação do personagem é conseguir consertar um protótipo mecânico de homenzinho(chamado no filme autômato),objeto de estudo do pai e capaz de escrever mensagens.Além disso, também precisa escapar das garras do guarda da estação de trem, que costuma prender órfãos circulando pelo local.A história não revela grandes surpresas:Hugo logo encontra uma amiga com quem faz grandes descobertas , inclusive a chave que consertara o homenzinho , revelando uma mensagem inusitada do criador do protótipo.O encanto reside, entretanto, na história por trás da história, na magia que é revelada através da descoberta de que o rabugento dono de uma loja de brinquedos é um cineasta,o celebre George Méliès,até então fadado ao esquecimento.Ao descobrir a mensagem do protótipo,uma cena de um filme de George Méliès( que, por cinematográfica coincidência,é avô da amiga de Hugo) é desenhada no papel,revelando sua assinatura.É previsível que as crianças descubram nos guardados do avô uma série de imagens sobre seus filmes e que encontrem numa biblioteca um professor aficionado pelo cineasta, que se propõe a ir até a casa dele, levando sua coleção de peças sobre Méliès e ainda uma última cópia de um filme deste. A visita torna-se uma exibição do filme na presença de sua esposa e das crianças e, o que também é previsível, da presença do próprio Méliès, que acaba se aproximando do grupo e revela seu segredo.É então que começa a real magia :ao reconstruir a trajetória do cineasta, o mérito do filme é ressuscitar todo um ambiente de sonho na construção de cenários e fantasias por Méliès,nos primórdios do cinema.Por nossos olhos maravilhados,passam criaturas fantásticas, foguetes que vão até a lua(Viagem a lua.George Méliès.1902),

sereias e estrelas,todas retratadas com fidelidade,seja na concepção cenográfica das histórias coloridas à mão,quadro a quadro,na produção das fantasias ou nas ideias do cineasta e de sua mulher,atriz e co-produtora de todos os seus filmes.E então a verdade vem à tona:após a Primeira Grande Guerra, com a triste ascensão da realidade ao universo mundial, os filmes de sonho e fantasia de Méliès foram, de acordo com o filme, deixados pouco a pouco de lado, razão pela qual o cineasta, num acesso de fúria, queimou todos os seus filmes e colocou uma pedra sobre seu passado, tornando-se comerciante.
A descoberta, como era de se prever, traz Mèliés de volta como cineasta e ,com a colaboração de seu público,possibilita a exibição de todos os fragmentos de filmes que conseguiram ser recuperados pelo professor, que organiza uma premiére para o artista.Ao subir ao palco e agradecer a seu público,Méliès afirma:"convido os senhores a sonhar comigo".Penso que o grande mérito de filmes como “Hugo Cabret” ou “O artista”,não trata apenas da expertise técnica de ambos, mas no fato de proporem os dois uma reflexão sobre o papel do cinema, para além da indústria monumental que se firma cada vez mais como produtora de entretenimento de alto custo e baixa magia. Sonhar é diferente de entrar em um devaneio com hora marcada para acabar,ou seja,o tempo certo de exibição do filme.O que “O artista” e,principalmente “A invenção de Hugo Cabret” fazem é convidar o público a imaginar,a penetrar no canto mais escondido de sua alma e corajosamente sonhar,em comunhão com a trama que é narrada na tela.Para além de entreter,os filmes,cada qual a seu modo,convidam a pensar não somente sobre a história do cinema ,mas na necessidade de trazer o espectador ao centro do processo criativo,compreendendo as origens dos filmes,mas também refletindo sobre a arte como um todo e da urgente,real e contemporânea necessidade,na sociedade das imagens,de pensar sobre o que se vê e ousar ainda usar a imaginação.

terça-feira, 6 de março de 2012

Cinema:entre a magia e o mercado

Nos dias de hoje, o ato de ir ao cinema pode implicar algo mais do que um simples programa despretensioso. Antes de tudo,demanda acesso a salas de cinema, privilégio existente em apenas 7% do território nacional (fonte: Ancine), localizadas marcadamente em grandes capitais e municípios com mais de 50 mil habitantes.Além disso,é necessário planejamento financeiro para uma parcela relativamente grande da população brasileira, para quem o ingresso médio de uma sessão custa por volta de R$10,00(Fonte:Site www.cinemadobrasil.org.br. 2010). Pode parecer pouco aos moradores das regiões sul e sudeste,cuja renda per capita gira em torno de RS900,00(PNAD 2009),mas se a observação recai sobre as regiões norte e nordeste o valor cai para a metade,apenas R$400,00(IBGE) o que torna o cinema um programa difícil,raro e caro. E num país onde os cinemas de rua entraram em gritante extinção (salvo os casos raros de empresas que resgatam símbolos da era dourada dos cinemas de rua como o ODEON BR,no Rio de Janeiro),substituídos por igrejas,lojas ou fechados definitivamente,a pequena parcela que pode assistir aos filmes o faz em shoppings,em salas de grandes complexos com evidente qualidade técnica e conforto,mas valor de ingresso compatível com os benefícios.
Do outro lado da tela os problemas não são menores.A produção, distribuição de filmes no país,apesar da grande retomada na década de 90 ainda é complicada,uma vez que,para começar as 20 maiores bilheterias dos pais são distribuídas por cerca de 10 empresas (fonte:Ancine.2010),multinacionais e com foco nas regiões mais ricas do país,concentrando os filmes entre sul e sudeste. A boa noticia é que a produção anda boa,obrigada.Do início de 2002 até 2011 o numero de ingressos pulou de 90.865 para 143.886(fonte:Ancine.2011) e as bilheterias bateram recorde com quase 18 milhões de ingressos (fonte:Ancine).Além disso,a fatia de mercado de filmes nacionais chegou a 20% do mercado,passando de 8% para 12%.Parte dessa informação pode ser explicada pela quantidade de lançamentos brasileiros (99,segundo estudo da Ancine) em comparação com 240 de estrangeiros.A outra razão se deve a um fator relevante na escolha do público:a publicidade.Uma rápida olhada na lista de maiores bilheterias de filmes nacionais depara-se com uma ampla divulgação de mídia , associada à produção,que escolhe rostos conhecidos do publico na televisão (a mídia ainda de maior alcance no país) como forma de garantir o retorno do investimento.Ou seja,o público de cinema no país ainda sai de casa para assistir a filmes, quando o faz, atrás de diversão garantida e mais do mesmo.Assim, sobra a festivais país afora a tarefa de fazer chegar a algumas capitais obras que de outro modo não se tornariam conhecidas.Em contrapartida o governo brasileiro firmou uma série de acordos de co-produção internacional com países latino-americanos e europeus que estimulam na criação de filmes e estreitam os laços entre os países.
O fato é que a magia do cinema nunca esteve tão presente, seja no formato película das novelas de emissoras de TV e a elevada qualidade de shows exibidos online (caso do show de Paul McCartney ,exibido pelo site terra) .A boa noticia é que a nova tecnologia vem trazendo no que diz respeito à criação e distribuição, a possibilidade de fazer chegar ate o público,obras audiovisuais de artistas pouco conhecidos,divulgando através da rede clipes de musicas,programas de variedades e ate mesmo filmes amadores cada vez com maior qualidade.
Prova disso é a música do grupo ”banda mais bonita da cidade”, Oração,que, em 3 dias foi acessado por 2 milhões de pessoas,para surpresa da própria banda.Por outro lado a evolução das câmeras digitais torna possível ao sujeito comum a possibilidade de participar de festivais de curta metragem e produzir e enviar seus filmes sem sair de sua casa,tudo isso via internet.Se por um lado,os gigantes da película concentram em poucas e privilegiadas salas de exibição obras de mercado,por outro,a produção independente e internáutica inicia,ainda que timidamente, um processo mais democrático de fazer,consumir e distribuir cinema.

Fonte:
www.cinemadobrasil.org.br/pt/mercado/o-brasil/
http://oca.ancine.gov.br/estudos.htm
http://www.culturaemercado.com.br/mercado/mercado-de-cinema-bate-recordes-no-brasil-em-julho/

Diário de Bordo - Terceiro dia de aula-Máquina de sonhos


Terceiro dia de aula e eu chegando atrasada. Depois de um começo leeeento,me deparo já à porta com milhares de termos técnicos ditos a exaustão com eficiência e rapidez pelo meu então recém conhecido professor de práticas audiovisuais.Nas mãos um aterrorizante manual técnico,ele dissertava sobre suas práticas no meio audiovisual e ele tinha muitas.A primeira coisa que pensei foi:Será que um dia também farei parte desse seleto grupo?A segunda coisa que me ocorreu foi que jamais dominaria tão complexa tecnologia. Confesso que deu muita vontade de sair correndo.Ao longo da ala,alguns alunos manifestaram-se, mostrando conhecimento e intimidade com câmeras e produções e pela primeira vez me senti um peixe fora d’água.Uma saudade enorme da minha pequena,minúscula faculdade de jornalismo bateu e pensei em como é difícil começar de novo.
Repassei mentalmente os motivos que me fizeram vir até a faculdade de cinema e o pânico de me tornar, de novo, uma prisioneira da tecnologia bateu. Esqueci de mencionar que trabalho há loooongos anos na área de tecnologia de informação e por motivos financeiros me vejo obrigada a permanecer lá,num cemitério profissional rodeado de pessoas muito satisfeitas(ou acomodadas)onde estão.Nessa perspectiva o desenrolar de termos técnicos era o que eu podia chamar de pesadelo,motivo pelo qual eu pensei em desistir e sair correndo de lá,aos berros.Foi quando o professor começou a falar sobre a relação mágica que existe entre o público e o filme e o poder de emocionar alguém sem que se chegasse mesmo a tocá-lo, apenas pelo artifício das imagens.É realmente poderosa essa tal de escrita da luz.
Conta-se sobre isso que o público presente à primeira exibição do filme dos irmãos Lumiére,”A chegada do trem”, saiu em desabalada carreira ao ver cortar a tela a maquina ferroviária em vertiginosa velocidade(para a época).Além disso, penso eu,a tecnologia do cinema passa pela circunstância da linguagem,fato esse que torna signos a combinação de cores,sons e sombras tornando o cinea uma grande ferramenta de comunicação.E,não bastasse isso,para coroar a transformação que começava a operar em mim,apavorada ante a perspectiva de novo embate com a tecnologia, a exibição de filmes da alunos da escola foi como um bálsamo,um convite a retornar ao sonho.Num dos filmes,a câmera era focada simplesmente nos pés dos atores,elevados a condição de personagens de uma prosaica história de encontros casuais entre homens e mulheres.O melhor,entretanto,ficou para o final.
No último filme, uma menina de óculos escuros ouvia música com fones de ouvido,sentada em meio a um jardim.Nas mãos uma foto com o provável namorado.De repente a câmera revive o personagem que tinha sido apresentado na foto e os namorados saem a brincar no jardim ao som da música tornada então pano de fundo para a ação.Logo vem o corte e a menina volta a ser retratada no jardim,tirando o fone cuja música lhe possibilitara o encontro então imaginário com o namorado.A câmera facilita as coisas, foca nas mãos da Jovem a foto que antes mostrara e então, ao afastá-la, surge um convite onde se vê a foto do namorado e duas datas marcadas, onde se sugere a vida e a morte que são a sucessão inevitável de cada um. E logo, eis que surge, na experiência individual do cinema, a mágica para além de toda arte, onde o poder reside no entreato de imagem e sentido.
Ao afastar a câmera,o público pode ver a menina sentada em uma cadeira de rodas, sendo empurrada para o interior de uma clínica por um indivíduo trajando roupas brancas.A ideia que automaticamente vem à mente é a narrativa da história da personagem,completamente destituída de palavras,mas tão somente do sentido visual ali presente:houve um acidente de carro,onde o namorado morreu e ela, a namorada, permaneceu viva para lembrar da história dos dois,fato reforçado pela música e pela foto.Ao acender das luzes todos nós, alunos e espectadores do filme, chegamos à mesma conclusão:fomos levados pela maestria dos narradores a imaginar a mesma coisa.Estava ali então ao alcance das minhas mãos a resposta que ainda não tinha enxergado:o cinema é a máquina de sonho,artifício e tecnologia de convidar a pensar e a comunicação é o fenômeno que ocorre no intervalo entre o ver e o sentir,entre público e imagem.Para além de toda outra forma de arte,o ilusionismo do cinema é o jogo coletivo do “nós”,mesclando diferentes sentidos na tarefa(belíssima)de escrever na luz.Estava eu então, diante de tal conclusão,definitivamente apaixonada.

sábado, 25 de fevereiro de 2012

Diário de Bordo 2-Primórdios do cinema





É certo que relações de amor demandam tempo e cuidado, mas a paixão do cinéfilo é sobremaneira angustiante. Afinal de contas relacionar-se com o objeto de sua afeição requer sempre horas de contemplação e paciência.A aula de hoje,sobre história do cinema,foi um exercício de ansiedade e paciência.Á medida que a professora listava uma a uma as escolas de cinema,seus representantes e as obras cinematográficas mais representativas da época,a vontade era congelar o tempo por alguns minutinhos e correr ao velho Google para visualizar o objeto da explanação.Durante a aula foi apresentado o quarteto fantástico da sétima arte.Segundo a prof.,W.Griffith ,Orson Welles,Rossellini e Godard são os grandes responsáveis por todas as modificações ocorridas desde a invenção do cinema.Iremos estudar as escolas de arte pré-cinema e pensar em tudo que aconteceu no sec. XIX,mais do em qualquer outro século é maravilhoso,uma vez que representa não só uma evolução tecnológica,mas uma série de mudanças estruturais no que se julgou chamar desde então sociedade e que transformaram não só a forma de viver e agir do homem ,mas todo um modo de pensar e ver a si mesmo e ao mundo.Ao passo que escrevo esse texto,ouço don´t let me down dos Beatles


Don´t Let me Down-The Beatles
e a melancolia de viver numa época onde os pioneiros das artes são rarefeitos me causa um enorme desânimo.Que sensação deve ter sido a de viver num tempo em que as mentes se abriam,mesmo que aos poucos,ao novo mundo e velhos conceitos caíam por terra,além da arte tornar-se de mera reprodutora do real,construtora de uma nova realidade.Num cenário como esse ,alguns loucos se dispuseram a registrar o movimento,trilhando o caminho para que o cinema pudesse acontecer.Dos irmãos Lumiére vem alguns dos primeiros registros cinematográficos sobre o movimento, já em 1895, ano oficial do nascimento do cinema.

Trecho dos primeiros filmes dos irmãos Lumiére

http://www.youtube.com/watch?v=4nj0vEO4Q6st


Nota-se a câmera parada, sem interferir na realidade, registrando o desenrolar da vida cotidiana, seja na saída dos trabalhadores da fábrica ou nos registros de vida familiar. Entretanto nada guarda maior caráter de mudança do que a imagem do trem chegando à estação,atravessando a tela e partindo,como um prenúncio de um novo tempo.No último filme,a derrubada de um muro torna-se objeto de uma experiência singular:retratados um após a outro,os movimentos de progressão do filme e regressão,são uma tentativa de controlar o curso da realidade,tornando-a outra.O cinema começa então a tornar-se maquina de ilusões.




Aqui, o quarteto fantástico:


W.Griffith: Trecho de o nascimento de uma nação-1915


Orson Welles: Cidadão Kane-1941



Roberto Rosselini-Roma Cidade Aberta-1945



Jean Luc Godard-alphaville 1965

sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

Diário de Bordo - Primeiro dia de aula





Recomeçar é sempre doloroso, principalmente quando se trata de algo que se ama, mas que nunca se teve a coragem de mergulhar. Começar o curso de cinema é como entrar numa montanha russa no escuro, sentindo o frio na barriga de encarar o desconhecido, sem saber o que vai acontecer no minuto seguinte. Entrando na faculdade no primeiro dia tive a sensação de pânico peculiar aos grandes começos. Pois bem,vá lá que seja,respirei e procurei pela sala de aula.Ninguém.Aluninhos espalhados pelo corredor me davam uma sensação bizarra de"o que estou fazendo aqui?"Uns bons minutos de espera depois a coordenadora chega e,simpática,começa a falar sobre o curso para os pouquíssimos alunos ali reunidos.Percebi que comunicação é um curso muitíssimo afim com cinema e que muita gente empreende o caminho que estava me assustando tanto.Mas ainda não dá pra tirar conclusões com base em tão baixo quórum,então vamos aguardar os novos alunos,isso só na semana que vem quando o ano novo carioca finalmente começa.De qualquer forma já deu pra sentir o gostinho,porque a segunda aula foi de produção e a simpaticíssima professora já começou a pôr nossas cabeças pra trabalhar,pensando na quantidade de coisas que envolvem uma imagem de filme dividida em 24 ou 30 quadros por segundo.São dezenas de pessoas reunidas com um só objetivo:emocionar.Segundo ela,diferente de demais áreas,o cinema é um grande coletivo de pessoas com ideias e personalidades diferentes que se unem em prol de um só objetivo.Deve ser absurdamente difícil de realizar,ainda mais se somarmos o tanto de ego que sempre existe em todas as artes e a dificuldade abissal de convivência entre seres humanos que se propõem a trabalhar juntos.Isso posto,falamos sobre o porquê de estarmos ali e fica evidente,mesmo num grupo tão pequeno,a paixão que une cada um de nós.Cinema,para Francis Ford Coppola,foi feito para impactar e o que pude perceber é que estávamos todos irremediavelmente tocados pela magia da sala escura e todas as histórias de filmes que estão gravadas na nossas retinas.Sempre tive como prazer maior a possibilidade de arrancar lágrimas e risos de quem quer que se arriscasse a ver alguns dos meus vídeos tosquinhos,feitos na base do Movie maker. Não se trata somente de captar o sentido,mas penetrar no reino da imagem e se deixar levar por ela,se tornar vulnerável à emoção e ao som de uma boa narrativa.Penso que me preparei para isso toda a vida,desde as histórias contadas pelos meus pais ,ou mesmo nas canções cantadas pelas minhas tias-avós na hora de dormir(tantas histórias que renderiam outro post.rsrs).Todas as experiências fazem parte da narradora que eu sempre quis ser,embora mantivesse a porta da imaginação quase sempre fechada.Não que o jornalismo não permita a criação,mas é sempre necessário manter um pé na realidade para não viajar demais.Agora,recém chegada no curso de arte(a sétima para ser mais exata),palavra essa impressa de forma belíssima em vitral na entrada da faculdade,chegou a hora de soltar as amarras e voar,sem para quedas,infinitamente pra variar.

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

Crítica do Filme:Dama de Ferro


Há um problema em escolher atores excepcionais em roteiros maravilhosos para personagens controversos da história. Corremos o risco de nos apaixonar pela persona de ditadores e assassinos contumazes antes mesmo de nos lembrarmos quem são. Há porem um lado mais assustador na empatia. O olhar da câmera, ao jogar luzes por sobre uma carapaça de sombras, revela a humanidade que há em todos nós, bandidos ou mocinhos, revirando nossas entranhas na perspectiva de encontrar em nosso ser o ingrediente maldito da monstruosidade e da intolerância. O que filmes como A queda, que retrata os últimos dias de Adolf Hitler, Into the Storm ,de Churchill e Henrique VIII, por exemplo, mostram é a nuance palpável de personalidades que escreveram a ferro, fogo e principalmente sangue seu nome na história. E se em Tempos de Tormenta (Into the Storm, 2009.Biografia de Churchil, primeiro ministro britânico durante a segunda guerra) a imagem do doce velhinho sentado em sua sala constituindo por si só a resistência que ergueu os aliados contra a égide nazista contrasta com seus ideais de limpeza étnica, o que dizer de Adolf Hitler sendo retratado em um bunker tão simpaticamente em suas relações com secretarias e demais subordinados ao ponto de ser duvidoso?Afinal,esta ali na tela o homem que forjou a solução final em seis milhões de judeus. Da mesma forma em Henrique VIII, a empatia desmedida do monarca britânico chega quase a justificar a execução sumária de um soldado, argumento fácil de impingir após longos minutos construindo uma personagem sedutora e corajosa para o rei inglês. Em 2012 o milagre da transformação atende pelo nome de Margareth Thatcher, vivenciada de forma brilhante por Meryl Streep. Em dama do ferro, a trajetória da primeira estadista inglesa é esmiuçada em detalhes, costurando dores e afetos em uma narrativa rica, desde sua juventude no partido conservador, passando pela construção do mito Thatcher, até o final da vida, encerrada em uma casa cheia de lembranças. Streep tenta ser durona como a ministra britânica, mas passa docilidade demais pelos olhos inquietos para que lembremos que sua personagem causou a morte de milhares de soldados argentinos e ingleses durante os conflitos pela posse das Falkland ou que a pesada carga de taxas causaram dezenas de protestos populares Inglaterra afora. Mas a atriz resiste,move-se mais rápido,tempera o olhar arrogante com silêncios contundentes e gestos mais amplos e convence muitos da seriedade de sua personificação.Entretanto é no contraste entre a hard lady e a idosa que mantém um diálogo com o marido morto que a mulher de ferro se humaniza.Já não se enxerga mais a tênue película que protege a atriz e a personagem.pronto,ela fez de novo,entrou com Meryl e saiu como Thatcher,sem que soubéssemos onde começou uma e onde terminou a outra.



E para quem acompanhou na história todos os desmandos de Margareth Thatcher,a casa onde no filme a personagem vive seus últimos dias carrega todos os fantasmas de uma existência(Na vida real consta que sua filha declarara não ser mais a mãe capaz de falar em público).Dos soldados da campanha das Falkland,guerra indecente travada com a argentina, aos milhares de desempregados frente à grave recessão vivida pela Inglaterra na década de 70,estão todos lá,dividindo espaço com o maravilhoso personagem que é o marido de Thatcher.Dennis,o marido da mulher de ferro,é a nota sensível e tresloucada da grande dama,suavizando suas crises de consciência,apoiando suas decisões e protegendo-a de sua própria força.E quando ela já não encontra mais adversários ou apoiadores ao seu lado,é a voz do marido que continua protegendo-a da solidão.Assim como no Brasil Getulio Vargas saiu da vida para entrar na história,no filme Dama de Ferro Thatcher abandona sua velhice para se entregar às sua próprias lembranças que compõem não só a sua história ,mas da Grã-bretanha moderna.Um filme belo e imperdível.
Na mídia,o filme levantou críticas,entre os dois lados da moeda e por motivos distintos:
"Se na Grã-Bretanha as críticas poderiam conter um mal disfarçado orgulho nacional ferido, na Argentina elas adquiriram um tempero político muitas vezes explícito..(O Globo Digital.Caderno de cultura.17/02/2012)

Matéria do Globo


Pra SABER MAIS:

http://pt.wikipedia.org/wiki/Margaret_Thatcher
http://www.tosabendo.com/conteudo/noticia-ver.asp?id=219933


Videos:
Meryl Streep GANHA O BAFTA, OSCAR LONDRINO







Trecho de A Queda:







Trechos de Into the Storm:


terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

Memoria e cinema

Memórias são construções que se inscrevem na pele, formando tudo que somos e determinando nossas ações e sentimentos. Ao olhar pra trás, a história de nossas vidas as por vezes parecem fazer sentido após anos de silencio ao examinarmos cada gesto com olhos contemporâneos. Em minha vida, por exemplo, o cinema sempre foi uma grande paixão e o maior dos meus prazeres, associado diretamente a afeto e a lembranças felizes. Lembro de passar a infância na casa da minha vó em santa Teresa e aos sábados e domingos invariavelmente, pegar o bondinho pra ir ate o centro no Metro Boa vista ou no Cine Palácio,


Metro Boavista,originalmente chamado Metro Passeio. Fechou em 28 de abril de 1997.





Cine Palácio,pouco antes de fechar para reformas,em 2008.

ambos cinemas que já não existem mais, embora o palácio,particularmente,conserve sua estrutura física, mas de portas fechadas.Era um passeio de sonho descer as ladeiras de santa e entrar no ambiente refrigerado e confortável das poltronas vermelhas, tapetes espessos e salas grandiosas,de arquitetura art. decó.Pouco importava o filme,o principal era adentrar aquele território sagrado onde o sonho e a realidade se confundiam.Além disso,havia o tradicional baleiro com doces coloridos(sim ,eu dou do tempo da bala boneco )e a diversidade de confeitos que só se encontravam na pequena banca de madeira carregada pelo vendedor conferia caráter extraordinário,especial,ao evento de assistir um filme.Mas não era só isso.

Cine Metro Boavista.localizado no centro da cidade .Fechou em 28 de abril de 1997

Havia que se comprar o saco de pipocas,cuja constância era tão importante ao ritual,o habitual cheiro de milho fritando com as latas de leite condensado sobre a carrocinha e os saquinhos de papel ,combinação que normalmente resultava em mãos meladas e correria para lavá-las antes da sessão.me lembro desde então da necessidade de adentrar esse espaço mágico onde a fantasia se aproximava dos olhos,sentada próxima a tios muito queridos que já sabiam ser esse o passatempo preferido para me entreter.Com meus pais,freqüentava amiúde o Paratodos e o Bruni
Méier,ambos no bairro onde moro até hoje

Cinema Paratodos.Inaugurado em 1935.Fechado na década de 1990.




Cinema Paratodos.Inaugurado em 1963.Fechado na década de 1990.



Além disso,havia o maravilhoso cinema Imperator que faz parte do grupo de saudosas construções que hoje se tornaram igrejas e lojinhas populares.



Cinema Imperator.Vendido em 1990 para virar casa de Shows

Lembro de aguardar ansiosamente o momento de me refestelar na poltrona e pensar como seria o próximo filme ,com a sensação de que nenhum outro lugar me faria tão feliz como o espaço compreendido naquelas salas escuras.Com os anos,as escolhas de filmes começaram a acontecer e de minha parte,o cinema era sempre o passeio sugerido ou ate mesmo imposto,por qualquer um que me acompanhasse,seja Amigo, parente ou namorado. Todos acabavam entendendo que a melhor forma de me fazer feliz era conceder um tempo de introspecção entre as paredes onde estivesse um projetor e uma boa historia a ser exibida. Confesso que mesmo na adolescência, em poucas situações fui distraída por qualquer coisa enquanto o filme passava e somente em uma única vez abandonei uma sala de cinema com meus pais,quando por engano entramos numa sala em que era exibido ou filme adeus meninos,certamente um clássico que eu apreciaria hoje, mas não com oito anos de idade, fator determinante para que todo acabasse saindo da sala e indo ate o café da Sloper, também de decoração art deco. Mas foi quando cheguei ao segundo grau, em um colégio publico federal de filosofia liberal e sem restrições aos alunos que o cinema fez mais parte da minha vida. Era comum faltar aulas e, acompanhada de amigos, frequentar as dezenas de cinemas que ainda existiam na tijuca nos anos 90. Íamos ao carioca, America, Art tijuca, Bruni Tijuca e todos os outros
que já não mais se encontram por lá a ponto de percorrermos, sem faltar um, toda a programação de filmes em cartaz e não nos restar mais nada a ver.



Cinema Bruni Tjuca.Funcionou de 1968 a 2000.






Cinema Bruni Tjuca.Funcionou até 1997

Dessa época me recordo de ter ficado impressionada com o que me lembro ser o metro tijuca e sua imensa sala de dois andares, onde exibia-se o filme O Corvo, onde o ator principal Brandon Lee morrera durante as filmagens. Entramos já no inicio do filme e a atmosfera soturna da historias, associada ao escuro da sala e a trilha sonora, pôs em polvorosa nossos espíritos adolescentes. Também me recordo de uma tarde memorável que passei em companhia de 4 amigas,quando assistimos Priscila a Rainha do deserto,numa tarde ensolarada em Copacabana no cinema Roxy, indo tomar sorvete no Alex. A vida nos meus 15 anos era uma promessa de liberdade e o cinema continuava representando tudo de maravilhoso que poderia existir, ocupando uma boa parcela daquilo que eu era e o que pretendia ser a partir de então. Alguns anos depois,já no papel de mãe,tive a seria preocupação de mostrar a minha filha todo o encantamento das salas escuras de exibição e tive a grata surpresa de encontrar ,com o passar do tempo,uma companheira de paixão cinematográfica ,embora não tão obcecada como eu,revelando que algumas paixões ( e loucuras)podem ser transmitidas geneticamente afinal.O cinema ainda faz parte da minha vida mas não da forma como poderia ser,afinal as salas carregadas de historia se foram,com exceção de umas poucas,patrocinadas por grandes empresas ou de pequenas salas como o cine santa,sobrevivendo as custas de poucos e apaixonados freqüentadores que buscam outras experiências além dos blockbusters em cartaz nas salas “plex” da cidade,eficientes porem sem historia para contar.Decerto podemos hoje debater sobre qualidade de áudio e vídeo,cinema em alta definição e som de ultima geração,poltronas reclináveis,pipocas sempre fresquinhas(de preço exorbitante) e ar condicionado em funcionamento(minha ultima experiência no Paratodos incluiu uma exibição de portas abertas por falta de ar condicionado,o que permitiu vislumbrar os enormes buracos nas poltronas e chão,paredes descascadas e infiltrações que me deprimiram) mas sem a poesia dos lanterninhas e do baleiro,do cheiro de pipoca de panela e das infinitas historias que cada uma dessas salas podia contar.Somos todos órfãos dos cinemas-poeira e de sua infinita magia,fazendo parte de nossas vidas e compondo o quadro cultural e cotidiano de cada bairro,construindo memórias e entrelaçando afetos,nas fotografias que carregamos ao longo da vida.Certamente nossos filhos e netos vem filmes com Maior qualidade e com maior conforto, mas lhes falta outro tanto de vivencia em cada experiência, uma vez que todas as salas parecem ser as mesmas e o valor dos ingressos diminuiu a freqüência de muitas famílias, para quem o cinema passou a ser um passatempo proibitivo. Construíram historias de estética perfeita em salas indefectíveis,mas ainda lhes falta o item essencial de cada experiência humana:a alma.

domingo, 12 de fevereiro de 2012

Cinema mudo:ousar sonhar





Crítica do filme O artista



Na seara cinematográfica o filme é a inscrição do movimento, a construção das palavras no dueto entre luz e sombra, tecendo significados ao sabor do tempo. Neste espaço sagrado,onde a sala de cinema é o altar onde fieis vem alcançar suas bênçãos,cada qual penetra por seus próprios pés em território fantástico,abraçando seus medos e desejos enquanto recebem sua porção de sonho.Altar de rituais mágicos ,o cinema constrói sua realidade no silêncio da sala escura e na inércia do corpo para a elevação da alma, ativando sentidos ao passo que confere a cada um a identidade do personagem que se apresenta na tela, figura etérea, reflexo do ser, humano por essência e divino por aclamação. Acima da humanidade postam-se os deuses olimpianos da película,desde o primeiro registro cinematográfico que contextualizava o tempo no desenrolar das imagens do cinematógrafo.E o olho humano,ao ver a grande novidade diante dos seus olhos,libertou-se da tarefa de registrar momentos e passou a tentar apreender sensações e pensamentos tornando a imagem puro sentir.E a plateia,condenada ao breu da sala,se entregava ao exercício do sonho vendo surgirem em sua frente reis e rainhas desfilando em estado de graça,para júbilo dos que os observavam.Até a década de 30,a composição do cinema vivenciou o sonho pela circunstância de limitar à imagem capturar a realidade,permitindo que os sons,componentes essenciais do universo real,permanecessem constituídos unicamente da música e da percepção de cada um. Assim é O artista,filme do diretor Michel Hazanavicius ,que ousa trazer em 2012 a magia do cinema mudo para as telonas cada vez maiores dos cinemas assépticos de shoppings mundo afora.o artista é um apelo à magia simples do cinema do inicio,do passatempo das massas,enchendo de risos as salas dos poeiras de dantes.George Valentim é o astro ingênuo e carismático que cativa o público com suas tiradas espontâneas,dominando as platéias e a mídia assim como Peppi Miller, ilustre desconhecida e aspirante a atriz. Quis o destino e o roteirista que os dois se encontrassem um dia ,frente às câmeras e a espontaneidade da senhorita encantou o ator,que,generosamente lhe deu um lugar nas filmagens(e no coração,embora nada aconteça no início).Ocorre que o cinema mudo,do qual George era o astro maior,encontrava seus últimos dias e a industria buscava novos rostos para ilustrar suas historias agora com imagem e som e achou a Peppi Miller.



"O artista"percorre os dois caminhos,da decadência dele e da ascensão dela,passando pelos encontros e desencontros de ambos,o que torna o filme um bom drama recheado de belos momentos de sintonia entre os dois.Mas o que torna o filme realmente fantástico é o resgate,seja pela ocorrência de se apresentar em p&b ou mesmo pelo fato de ser mudo,da ingenuidade dos filmes clássicos e a magia do cinema original,onde atores e atrizes usavam seus corpos e rostos para dar o tom dos personagens,conferindo grande dramaticidade às cenas.Além disso a fotografia primorosa joga com reflexos de espelhos para indicar emoções dos atores,viradas de câmeras para mudar estados de espírito e uma deliciosa cena de Peppi contracenando com um paletó,num dueto belíssimo,pela sutileza e resgate do cinema como máquina de fabricar ilusões.De fato,o advento do som ,aliado ao crash da bolsa de nova York em 1929 transformaram o modo de fazer filmes,concentrando a produção em poucos estúdios e tornando as películas produtos de consumo por excelência, à parte a qualidade com que eram feitas. O artista conta um pouco dessa historia,resgatando ícones do cinema de origem,como as musas intocáveis e os galas ingênuos,os números de dança e as ilusões quase circenses dos primeiros filmes.É uma homenagem belíssima à memória cinematográfica e todos os seus personagens,um convite à delicadeza dos filmes de Charles Chaplin e ao encanto dos musicais de Fred Astaire e Ginger Rogers, sem perder a ingenuidade dos números de circo, onde o espectador nunca sabe o que vai acontecer depois. O artista é uma declaração de amor ao universo fílmico,emocionando a platéia ao passo que constrói uma metalinguagem para falar de si mesmo,uma poesia visual e sonora criada com ousadia por Hazanavicius .Em tempos de reedições,filmes em 3D e mais do mesmo,o artista é um sim à criação e a beleza do cinema em toda sua simplicidade,um convite ao mergulho no ilusionismo das salas escuras e um resgate a magia dizendo que sim,é possível voltar a sonhar.Resta ao público a escolha corajosa de mergulhar.

Veja o trailer: