Trailer A delicadeza do amor
Obs.:Essa história foi livremente inspirada no filme A delicadeza do amor,de 2011.Qualquer semelhança não terá sido mera coincidência.
No jardim onde Nathalie aguarda, Markus passeia devagar, reencontrando a cada passo restos da infância da mulher que hoje, mãos postas sobre olhos fechados, respira lentamente enquanto conta até 20. A cada momento, nas sombras do jardim, ele vê uma a uma, as meninas que um dia foram a pequena Nathalie, de vestido rodado e laço de fita nos cabelos, colhendo flores no jardim da avó e a vê logo ali, deitada na grama, um livro ao colo e a cabeça a contemplar as nuvens. Erguendo um galho da pequena trepadeira, Markus descobre uma Nathalie adolescente. Pernas pro alto, sonhadoramente,desenhando palavras no diário que está em suas mãos.Na janela a avó chama para o café,mas quem levanta já não é mais uma adolescente, mas uma mulher de seus 20 anos,que puxa pelas mãos um rapaz alto e magro e o apresenta à avó.Ele tem nas mãos uma pequena caixa de veludo azul e a avó,ao contempla-los , sorri. Markus fecha seus olhos e enxerga uma Nathalie mais velha, pálida, que caminha em direção ao canto mais fundo do jardim e se deixa cair na grama , aos soluços.Em suas mãos a mesma caixinha azul e na outra um telegrama, amassado. Em todas , ele vê a mesma mulher que agora vai chegando ao número 17 em sua contagem e espera que ele se esconda, para depois ir procurá-lo. A mesma mulher que ficara viúva jovem e que passara os últimos cinco anos enterrada em seu pequeno escritório e que um dia , sem razão aparente,cruzara com ele no caminho do bebedouro do sétimo andar do prédio em que trabalhavam.Bastara. Ao ouvir o barulho ritmado dos saltos baixos em que ela se equilibrava e contemplar a blusa vermelha que ela vestia,Markus sentiu que a vida se esvaía por entre os segundos que separavam esse momento de todos os outros que vivera. Era ali, num ambiente costumeiro, cotidiano,que os dois se encontravam todos os dias. Mas naquele dia, por estar demasiadamente distraído ou porque o dia estava silencioso e calmo, ou pela temperatura estar amena, foi que ele ouviu plenamente cada um dos ruídos que Nathalie fazia ao caminhar. O som dos saltos, o barulho do plástico das pastas em sua mão, o leve mover-se do tecido da saia comprida e um quase imperceptível som dos joelhos magros dela, que se moviam rapidamente, passo a passo.Dali para o café e o sorriso , o teatro e as caminhadas até o metro,comentando a última peça que assistiram foi um passo.E a cada dia, mais nítidos ficavam os passos, que paravam brevemente para dizer bom dia e retomavam seu caminho.E um dia,na saída do metro,assim sem avisar,as mãos se cruzaram no limite da curva do metro.Medo. Markus desaparecera do escritório por uma semana, para que Nathalie soubesse que tudo estava acabado.Tudo o quê?Se não tinham um caso,se não havia compromisso,como era que reconhecia seu caminhar dentre todos os outros?E assim, sofrendo com a falta daquilo que não tinha,foi que Markus irrompeu da sua sala e ,num esforço gigantesco,chegou até onde Nathalie estava e disse, simplesmente:sim.Ela se assustou, ficou em silêncio,mas logo depois,sorriu. Pegando-o pela mão, levou-o ate o carro dela e abriu a porta. Ele entrou e ela dirigiu em silencio por algumas horas. Logo chegaram a uma cidadezinha próxima e ela estacionou em frente a um velho portão. Era a casa da avó. A velha senhora olhou Markus profundamente por alguns segundos,sorriu para Nathalie e disse:Entrem, vou fazer um café para nós.enquanto passava o café,Nathalie pegou-o pela mão e levou-o até um quintal nos fundos da casa. Então disse: Era aqui que eu passava as minhas tardes desde criança. E ficou em silêncio. E então Markus entendeu:ao leva-lo lá, ela abria uma porta para que ele penetrasse em seu universo interior, erguesse o véu de suas lembranças e compartilhasse com ela cada momento. Viu todas as faces da menina e da mulher que ela fora e mergulhou em cada dor,cada sorriso,cada etapa de construção da pessoa que fechava agora os olhos,na contagem do pique esconde. Tudo que ela fora permanecia ali,em suspensão. Mas por sobre a poeira,intangível,permaneciam os mesmos laços de antes. Ao levá-lo lá,nas profundezas de sua memória,Nathalie abria a janela para o novo e retomava mais uma vez seu caminho pelo jardim.
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